Janot, descascando uma batata quente, está mandando todo mundo pra prensa...

Janot, descascando uma batata quente, está mandando todo mundo pra prensa…

— O gordim tá ca mulesta, sô! — Era Orozimbo, sentado, satisfeito, em seu toco e bebendo seu indefectível café amargo. Eu o olhei de sobrecenho erguido. De quem ele falava?

— Uvi meu netim, o Arthurzim, lê umas notiça dos jorná pr’eu uvi, num sabe? E apois num é qui o gordim da tar Procuradoria da Repúbrica deu de mirá no tar de Aécio e, de quebra, tombém na Dirma e no Lula? Ele arresorveu metê os gato tudo num balaio só. Êta cabra bom!

— Hummm… — Fiz eu, com desânimo. — Acho que tudo isto é pra inglês ver, meu caro. Eles são considerados “poderosos” e, agora também, “milionários”. Em nosso país não se pune verdadeiramente nem poderosos nem milionários. Um puxão de orelha, com um afastamento provisório da vida pública e pronto. Ei-los de volta, após oito anos de descanso, para o mesmo sistema péssimo que eles criaram para se manter ali desde 1888 e se locupletar e se perpetuar no Poder. 

— Pode inté sê, num sabe? mas véi uviu a fessora de meu netim dizê qui dessa veiz a coisa vai.

— Vai, sim. Mas para o brejo — rebati, negativo.

Ele etá ficando político e nem desconfia.

Ele está ficando político, mas nem desconfia.

— Home, num é vancê qui vévi dizendo qui a gente tem de tê fé? Entonce! Tenha fé, sô! Óia, o povo tá-se mobilizando pra combatê aquele negóço de fôro privilegiado. Véi se alembra qui há munto tempo vancê vem isperniando sobre isto, num é mermo? Apois bem, agora há um movimento do povão no sentido de retirá dos pulíticos, todos eles, esse tar de fôro privilegiado. Se eles consegui tamanha vitóra, entonce, home, as coisa lá pru riba vão mudá, ora se vão! Cum toda certeza, a roubaieira vai diminuí qui é uma belezura, vancê num acha não?

— É… Acho que este é um passo importante. Mas há outro muito mais importante, para o qual o povão ainda não atentou. E eu falei dele aqui, ontem. Arthurzinho deve ter lido o que escrevi pra você, não leu não?

— Leu. Ele lê tudo qui vancê iscreve. E pr’ele, vancê dixe tá dizido, num sabe?

— Quem dera que eu tivesse mais olhos de ver e ouvidos de ouvir, comigo.

— E apois num tem não, é?

— Acho que não.

— Num ache. Quando arguém acha qui as coisa vão de mar a piór, entonce, home, elas danam de ir mermo. Num ache, sô! Aquerdite qui quem lê, mermo qui seja pôco, vai passá adiante suas idéia e seus protesto. Arthurzim, pur exempro. Ele faiz isto e faiz cum todo coração. Espaia pra mininada toda e inté lê pr’eles uvi.

— Tudo bem, tudo bem. Suponhamos que seja assim, só pra não contrariar sua boa fé — concordei, resignado. Satisfeito, Orozimbo continuou.

— Agora, vortando ao gordim, ele tombém mandô bala no tar de Edinho Sirva, aquele feioso do PT cum quem vancê num simpatiza. E mandô chumbo no lombo grosso do tar de Eduardo Cunha. Liás, este tá se remexendo todo. E apois num é qui o Supremo mandô arretirá ele à força da cadeira de Presidente da tar de Câmara? O bichim cuspiu fogo pelas venta, hoje, de menhãzinha. Os home da Lei forum lá na casa do gordo disingonçado intregá o parpé qui mandava qui ele fosse arretirado à força lá da Presidença. E num é qui o bicho se arreliô todo? Num quiria arrecebê a tar de intimação nem pelo cocô da vaca seca, sô!

— Não é o cocô que é seco, não? — Perguntei, rindo.

— Num é não. O ditado véio diz qui é a vaca e vancê num pregunta pr’eu pru quê qui eu num sei. Dês qui eu era petititim ansim qui já uvia meus avó falá isso, ora apois!

 — Bom — disse eu para fugir do debate — ouvi na TV que realmente ele foi intimado pelo Supremo e que se rebelou contra o recebimento da intimação. Mas teve de entregar os pontos. A esta altura, não é mais o Presidente em exercício. E sem a Presidência ele é um guerreiro medieval sem seu escudo. Vai levar porrada com certeza.

— E nm é bão?

— Orozimbo — disse eu, olhando-o nos olhos —, pelo menos um terço do Brasil passou a gostar do crápula só porque ele defenestrou a Dilma…

— Defe… defe… O qui diabo é isso aí?

Fenestra, em latim, queria dizer “janela”. Daí se criou, em português, o verbo “defenestrar”, que quer dizer “jogar pela janela; jogar fora;”

— Entonce o qui vancê quis dizê foi qui ele jogô a Dirma pela janela do palaço onde ele véve?

— Isso aí.

— Entonce, diabo, pru qui é qui num dixe logo isso? Pra que impregá um nomão feio desses?

— Para perlustrar sua santa beocidade — disse eu, às gargalhadas. Meu velho amigo arregalou os olhos e se pôs de pé, agressivo.

— Aí, ome, véi é seu amigo, mas se tá xingando eu, lhe sento os pé, tô dizendo!

—Eu estou brincando, Orozimbo. Deixe de ser amargo, merda!

— Merda?! Tá me xingando de novo, é?

— Não. Foi só uma expressão enfática, só isso.

— Êta capeta! Vancê tá a fim de me aburrecê, sô? Já meteu essa tar de enfática na cunversa. Pru quê?

— É melhor a gente voltar para a política, não é não?

— Não! Véi azedô, diabo! E qué sabê o qui vancê quis dizê cum essa tarzinha de enfática. É arguma pulítica petista, é? Vancê tá chamando esse véi aqui de petraia?

A dança da morte do Brasil. A Capoeira jamais foi uma Arte Marcial que se pode domar. Quando jogada de verdade ela mata.

A capoeira é uma arte de matar, tanto quanto o Tai-Chi.

— Orozimbo, senta aí e deixa de valentia. Quem tem medo de valente é frouxo e isto eu não sou. Então, senta aí ou vai embora, diabo! — Falei duro e me pondo de pé, também.

— Vancê vai peitá esse véio, vai?

— É só você balançar o corpo. Experimente e vai ver. Vou-lhe machucar pra valer.

— Vancê? — Ele soltou uma sonora gargalhada. — Vancê nem se agüenta de pé, ome! Suas costa danam de duê, ora! Véi só num lhe dá uma lição pruqui vancê tá véi e alejado, só pur isso.

— Obrigado pela consideração. Mas você apanharia de meia, pode crer. Agora, senta e vamos continuar conversando.

Hesitante, ele concordou e voltou a se sentar no toco de que tanto gosta.

— Tá bão, véio senta. Afiná, num vim aqui pra brigá cum vancê, né não? Entonce, vamo lá. Mas vamo saí da pulítica qui esta bosta inté joga nóis dois um contra o otro, siná de qui num presta mermo. 

— Não é a politica. É seu gênio esquentado, ora! — Reclamei, mirando-o sério. Ele deu de ombros.

A Mais Bela Arte Marcial de todos os tempos.

Movimentos lentos são bonitos. Rapidíssimos são mortais.

— Pra véi é a pulítica, nhor sim. A gente pode inté falá de otras coisa, mas só a pulítica põe nóis dois im pé de guerra.

— Não devíamos-nos aborrecer por causa a Política. Afinal, a gente não ganha nada com isto. Só opila o fígado.

— Mas é vancê mermo qui véve dizendo qui todo mundo divia de sê pulítico, ome. Divia de se alistá num partido pra puder brigar contra os patifes qui tão lá dentro. Ou será qui véio intendeu tudo errado?

— Não. Está certo. Mas… Vamos mudar o rumo desta prosa?

Ele me considerou em silêncio por um tempo. Então, com um suspiro, assentiu com a cabeça.

— Tá bão não.Véi avisa qui já tem interesse nesse negóço e vancê num vai iscapá ansim, tão farce cuma pensa. E cuma véi dizia, o gordim mandô o Supremo indiciá o Lula. Agora, véi qué proguntá a vancê o qui é indiciá?

— Indiciar, na Lei, quer dizer  denunciar, acusar. Lula foi acusado de crime por Rodrigo Janot.

— Ah!… Entonce, só farta metê ele na cadeia, né não?

— Não. Tem muita água pra rolar sob essa ponte, meu velho. Lula é raposa velha e está cercado por “burros” comprados com nosso dinheiro e o dinheiro da Petrobrás. Vai dar trabalho colocar o bicho atrás das grades.

— Mas ele vai, num vai não?

— Bom… Tem de ir. Rodrigo Janot não é homem de soltar a corda, quando entra num cabo-de-guerra. E ele está todo dentro desse aí, dos petralhas contra o Brasil. Graças a Deus, Rodrigo Janot está a favor do Brasil, senão ia dar trabalho.

Orozimbo ficou pensando um pouco.

—É… Ele tombém tá nos calo da Dirma, pelo qui este véi aqui uviu. Mandô investigá ela tombém. Parece qui a véia feia andô querendo atrapaiá a investigação qui a Puliça Federá fazia sobre seu padim, o Lula. Agora… O qui é obstruí? Progunto purqui a fessora de meu netim falô esta palavra e véi ficô sem intendê o qui ela quiria dizê.

— Obstruir é justamente atrapalhar — disse eu. 

— Ah… Bom, entonce véi intendeu dereitim. Agora, home, o qui é qui eles tão querendo fazê cum as aposentadurias dos brasileiro? Véi num intendi qui eles acusem os veín aposentado de sê os curpados pelo buraco no INSS…

— Nâo é bem assim. Primeiro: há uma gritante diferença entre os aposentados do INSS e os aposentados do Serviço Público. Estes, quando se aposentam, vão com todo o dinheiro que acumularam em seus salários. Os qüinquênios; as gratificações de função etc… No total, há aposentado público que ganha a bagatela de R$ 100.000,00 por mês. Eles são poucos, diante do contingente do INSS, mas só eles ganham por cinco INSS, entendeu? E quem paga isto é o Estado Brasileiro. Não é a aposentadoria dos velhos do INSS. Estes, já pagaram pelo Seguro Social a vida toda e têm um teto de aposentadoria. Ninguém se aposenta ganhando além deste teto. Mas os servidores públicos, municipais, estaduais e federais, não obedecem a esta regra. Inclusive os políticos, cujas aposentadorias milionárias são um caso à parte. A rigor, nós, do INSS, não deveríamos ter nada com isto. Nossa aposentadoria é toda ela particular. Durante trinta e cinco anos de trabalho duro nós depositamos uma quantia para nossa garantia na velhice.  O Governo não coloca nem um centavo ali dentro. Mas os políticos enrolaram tanto a situação que nós, do INSS, também vamos pagar o pato.

— Enrolada essa históra, né não?

— É.

— Mudando de assunto, ome, o qui é usufrutáro?

—Usufrutário é a pessoa que usufrui de algum direito sobre alguma coisa. Por que?

— É qui o tar Cunha dixe qui era isso aí.

— Ah… Não acredite em nada que ele diz. O homem é mestre em escapar da Justiça. Certamente usou este vocábulo para se definir com relação a algo criminoso. Uma conta no exterior, por exemplo.

— E foi isso mermo. Ele dixe qui num era dono da tar conta, mas apenas usufrutáro. Mas vortando ao caso do Cunha, home, vancê cunhece um tar de Waldi Maranhão?

— Ficha suja. Está enrolado com o Petrolão e, logicamente, com o Juiz Moro. Por que?

— E apois num é qui é esse tar de Maranhão qui ficô no lugar do Cunha? Um ladrão substitui outro ladrão no Poder brasileiro? Pode?

— Pode. Aqui, em se plantando tudo dá. Dá até ladrão substituindo ladrão.

Orozimbo ficou calado um tempão. Depois, levantando-se, disse:

— Véi imbora. Vancê num tá bom pra cunversar, ô xente!